Preparar um ciclo olímpico ou paralímpico curto, de aproximadamente dois anos e meio, é complicado. Fazê-lo em meio ao impacto dos altos e baixos da pandemia do novo coronavírus (covid-19) torna o desafio ainda maior. Não basta ter plano A ou B. É necessário ter mais coelhos prontos para saírem da cartola, seja pela dificuldade de acesso a países mais fechados em razão do caos sanitário, seja pelo eventual adiamento de competições - às vezes, de suma importância na trajetória.
Na semana passada, o Comitê Paralímpico Internacional (IPC, sigla em inglês) suspendeu o Campeonato Mundial de Atletismo Paralímpico - que seria disputado entre 26 de agosto a 4 de setembro, em Kobe (Japão) - a pedido dos organizadores, devido ao avanço de casos da covid-19. A entidade pretende realizar o evento em 2024, antes dos Jogos de Paris (França). Não seria exatamente uma novidade em meio à pandemia, já que o Mundial de Esportes de Neve, em Lillehammer (Noruega), que inicialmente seria em 2021, acabou no domingo (23), a 40 dias da Paralimpíada de Inverno de Pequim (China).
Considerando que já haverá um Mundial de Atletismo em 2023, de 8 a 17 de julho, também na capital francesa, o intervalo entre os torneios pode ser de apenas um ano. Até menos, se a competição em Kobe for remarcada para o início de 2024. Isso sem esquecer os Jogos Parapan-Americanos de Santiago (Chile), entre 17 e 25 de novembro do próximo ano. Incertezas que, naturalmente, impactam o planejamento.
"Seriam três eventos dentro de praticamente um ano. No Parapan, a ideia é irmos com força máxima, como sempre. É uma prioridade. Em relação ao Mundial em 2024, se confirmado, tudo dependerá do período. Se ele for próximo aos Jogos, facilita, por você poder fazer o treinamento visando os dois eventos. Se for mais espaçado, complica. Depois do Parapan, são seis, sete meses até os Jogos. É um período ideal para treinar. Se tiver um Mundial nesse meio, dependendo de quando ele for, pode atrapalhar o treinamento. Aí, teremos de optar, avaliarmos as provas ou irmos com uma equipe de jovens. A Paralimpíada é o objetivo principal. Tudo está sendo pensado, estamos esperando as confirmações e as datas", descreveu João Paulo Cunha, coordenador da seleção paralímpica de atletismo, à Agência Brasil.
O adiamento também mexe com o planejamento de competições do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB). De 27 de março a 3 de abril, o Centro de Treinamento Paralímpico (CTP), em São Paulo, será sede do Open Internacional, etapa do circuito mundial de atletismo paralímpico. Segundo João Paulo, estavam previstos mais três eventos junto da Confederação Brasileira de Atletismo (CBAt). Os quatro torneios serviriam para os atletas estabelecerem índices para Kobe.
"Tivemos uma reunião com a CBAt, para firmar a parceria. A princípio, vamos inverter: fazer um evento [com eles] no primeiro semestre, mais um evento em São Paulo e três regionais [no segundo semestre]. Com o Mundial [de Paris] em julho do ano que vem, teremos o prazo para obtenção de índice sendo de mais ou menos um ano, então a ideia é que ele já possa valer a partir do segundo semestre", explicou o coordenador.
Base é alternativa
Sem a competição em Kobe, o calendário internacional do atletismo paralímpico prevê o Mundial da Federação Internacional do Esporte para Amputados e Cadeirantes (Iwas, sigla em inglês), de 2 e 9 de outubro, em Sochi (Rússia). Em meio às incertezas no "adulto", a base deverá ser a protagonista da temporada, com os Jogos Parapan-Americanos de Jovens, em Bogotá (Colômbia), e o Mundial de Jovens (ainda sem local definido). As datas de ambos os eventos não foram anunciadas.
"O evento da Iwas não costuma ser um evento forte, mas acreditamos que desta vez será, sem o Mundial [de Kobe]. Nosso plano A é ir com uma seleção jovem para o Mundial da Iwas, além do próprio Mundial de Jovens. Se realmente não tiverem mais eventos fortes este ano, a ênfase será mesmo na base. Estamos com ideia de fazer alguns eventos sub-17 e sub-20, já pensando nos Jogos de 2028 e 2032", disse João Paulo.
"A base da seleção [da Paralimpíada] de 2024 será basicamente a dos Jogos de Tóquio [Japão]. O que pensamos sempre é aumentar a quantidade de atletas jovens, pois eles terão muito mais tempo de seleção. Estamos desenvolvendo quantidade para depois afunilarmos e termos qualidade. Tivemos atletas sub-23 com medalhas [em Tóquio] e queremos que eles permaneçam, pois a chance de medalharem também em Paris é muito grande. Temos de manter isso e buscarmos mais nomes. Faço um paralelo com a natação, que há alguns anos dependia quase exclusivamente de um atleta [Daniel Dias] para ganhar sete ouros nos Jogos e hoje isso se diversificou. Esse é nosso objetivo", completou o dirigente.